Entendimento do TCU para participação de empresas com sócios em comum em pregões eletrônicos

Pregão

Tema que tem despertado bastante polêmica atualmente é a participação de empresas com sócios em comum em pregões eletrônicos. Seria possível a Administração inserir no edital de licitação, cláusula impedindo a participação de empresas se atestada essa condição?

Ao que parece, o simples fato de duas empresas possuírem sócios em comum não constitui qualquer vício ou irregularidade que, de plano e por si só, autorize a Administração prever no instrumento convocatório de licitação processada pela modalidade pregão (especialmente na sua forma eletrônica), vedação à participação no certame.

Primeiro, porque a ordem jurídica não impede uma pessoa física ou jurídica compor o quadro societário de mais de uma pessoa jurídica. Segundo, porque o simples fato de empresas com sócios em comum participarem da licitação não permite a Administração concluir que essa atuação se dará de forma fraudulenta ou mesmo com o objetivo de frustrar os objetivos da licitação.

Pelo contrário, a presunção é da boa-fé e da inocência, até que se prove o contrário. Daí porque, como a Lei nº 10.520/02 não prevê a situação narrada como impeditiva para participar de licitações processadas pela modalidade pregão, será preciso reunir elementos suficientes que comprovem a prática de ato capaz de frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo do procedimento licitatório.

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Recentemente, o TCU manifestou-se sobre a ilegalidade de cláusula de instrumento convocatório que, de plano, vedava a participação na licitação de empresas que possuíssem sócios em comum:

Acórdão nº 2.341/2011 – Plenário

Voto

3. Rememorando, a providência cautelar foi adotada ante a iminência da abertura do certame, o que caracterizaria o perigo na demora, e tendo em vista a presença de indícios do bom direito, eis que a cláusula do edital questionada pela autora, relativa à vedação da participação simultânea de empresas com sócios comuns poderia alijar potenciais interessados do certame, não possuía amparo na Lei nº 8.666/1993, nos regulamentos próprios das entidades ou na jurisprudência do TCU.

4. Na oportunidade, foi suscitado o entendimento estabelecido no Acórdão nº 297/2009-Plenário, que somente considera irregular a situação em apreço quando a participação concomitante das empresas se der em:

i. convite;

ii. contratação por dispensa de licitação;

iii. existência de relação entre as licitantes e a empresa responsável pela elaboração do projeto executivo; e

iv. contratação de uma das empresas para fiscalizar serviço prestado por outra.

5. Tais hipóteses não se configuraram na concorrência em apreço em que não foram apontados também indícios de conluio ou fraude.

(…)

(…)

13. Ressalto que há recomendações deste Tribunal similares à da CGU, referida anteriormente. No item 9.7 do Acórdão nº 2.136/2006-TCU-1ª Câmara, prolatado quando da apreciação do TC-021.203/2003-0, da minha relatoria, esta Corte de Contas recomendou ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG) que

“(…) oriente todos os órgãos/entidades da Administração Pública a verificarem, quando da realização de licitações, junto aos sistemas Sicaf, Siasg, CNPJ e CPF, estes dois últimos administrados pela Receita Federal, o quadro societário e o endereço dos licitantes com vistas a verificar a existência de sócios comuns, endereços idênticos ou relações de parentesco, fato que, analisado em conjunto com outras informações, poderá indicar a ocorrência de fraudes contra o certame.” (grifei)

14. No mesmo sentido, o Plenário desta Casa analisou, recentemente, auditoria realizada pela Secretaria de Fiscalização em Tecnologia da Informação (Sefti) na Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação (SLTI) do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, no âmbito do TC‑011.643/2010-2, relatado pelo eminente Ministro Valmir Campelo.

(…)

16. Ao apreciar o citado processo, o Plenário, por meio do Acórdão nº 1.793/2011, acolheu proposta do relator e fez recomendações à SLTI/MP; veja-se:

“(…)

9.3.2. promova alterações no sistema Comprasnet:

9.3.2.1. para emitir alerta aos pregoeiros sobre a apresentação de lances, para o mesmo item, por empresas que possuam sócios em comum, com vistas a auxiliá-los na identificação de atitudes suspeitas no decorrer do certame que possam sugerir a formação de conluio entre essas empresas, em atenção ao art. 90 da Lei nº 8.666/1993;

(…)”

17. A toda prova, portanto, que no caso da recomendação da CGU, trazida aos autos pelos agravantes, bem como nas situações similares, em que houve a atuação desta Corte de Contas, o que se pretendeu foi alertar os responsáveis pelos certames licitatórios sobre uma situação de risco, configurada pela participação, no processo, de empresas com sócios em comum.

18. Tal risco, conforme bem expresso na recomendação do Acórdão nº 1.793/2011-TCU-Plenário, deve ser mitigado, mediante identificação das empresas que se enquadrem nessa situação e de outros fatores que, em conjunto, e em cada caso concreto, possam ser considerados como indícios de conluio e fraude à licitação.

19. As situações expostas, portanto, são bem diversas da que se verifica nos presentes autos, em que se fez uma vedação a priori, ao arrepio da legislação aplicável, impedindo, sem uma exposição de motivos esclarecedora ou outros indícios de irregularidades, que empresas participassem do certame, ferindo, sem sombra de dúvidas, os princípios da legalidade e da competitividade, a que estão sujeitas as entidades do sistema “S”.

Segundo essa manifestação do TCU, a participação de empresas com sócios em comum somente constitui ilegalidade nas hipóteses de: i. convite; ii. contratação por dispensa de licitação; iii. existência de relação entre as licitantes e a empresa responsável pela elaboração do projeto executivo; e iv. contratação de uma das empresas para fiscalizar serviço prestado por outra.

Já nas demais situações, tal fato deve despertar a atenção da Administração para eventual conduta suspeita ou fraudulenta, mas não autoriza inibir, de plano e por si só, a participação dessas empresas.

Com base nessas razões, parece possível concluir que, segundo o atual entendimento do TCU, em um pregão eletrônico, a simples comprovação por meio de consulta realizada no SICAF, da existência de sócios em comum de empresas que disputam certame não é suficiente para afastar essas empresas da licitação.

De igual modo, a própria legalidade do instrumento convocatório que porventura tenha estabelecido a vedação dessa ordem pode sofrer questionamento e reprovação, segundo o precedente citado da Corte de Contas.

Apenas na hipótese de a Administração perceber indícios de conluio ou de fraude é que se admitiria o afastamento dessas concorrentes, com base na reunião das informações capazes de evidenciar potencial prejuízo à competitividade e isonomia do certame.

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