Sobre os conceitos de autoria, projeto e obra de engenharia

Obras e Serviços de EngenhariaPlanejamento

Uma
rápida busca nos dicionários de língua portuguesa é suficiente para obtermos
consenso acerca da essência do vocábulo projeto. Projeto é a formatação
no presente de algo que se pretende realizar no futuro.

Verticalizando
à temática em destaque, foi o Decreto nº 75.699/1975 que promulgou a Convenção
de Berna
para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas. Entre
os tipos de obras que gozam da referida proteção, o projeto foi taxativamente
previsto. Mais recentemente, a Lei nº 9.610/1988 consolidou a legislação sobre
os direitos autorais e, para além de ratificar o rol de obras protegidas, destacou
os projetos de engenharia (art. 7º, inc. X).

Assim
sendo, os projetos de engenharia se revelam como tipos de obras intelectuais,
pois derivam da criação do próprio espírito humano (intelecto). Via de efeito,
os autores serão as pessoas físicas criadoras da respectiva obra intelectual,
seja ela literária, artística ou científica. Por tal motivo, o autor de um
projeto de engenharia terá reservado seu direito autoral.

Tal
corolário nos conduz à uma definição cabal para obras de engenharia. Uma obra
de engenharia nada mais é que a materialização de um projeto de engenharia.

Aparentemente
simplória, a obviedade do raciocínio tem aplicação demasiada importante. É que,
se a autoria de um projeto de engenharia está protegida, a obra dele derivada
goza de relevante atributo. A identidade. Não pode uma obra existir a
partir de 2 projetos distintos. Se a obra não seguiu o projeto original é
porque o projeto foi modificado, ainda que tal modificação não tenha sido
regularmente fixada.

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A
Lei nº 5.194/1966 regula as profissões de engenheiro e reserva seção especial à
responsabilidade e autoria (arts. 17 a 23). O diploma é categórico em
determinar que qualquer alteração do projeto de uma obra de engenharia somente
poderá vir a cabo pela intervenção do seu próprio autor. Além disso, a Lei
reserva o direito de o autor do projeto acompanhar a execução da obra, garantindo
que aquilo por ele criado seja executado à estrita obediência.

Reforçando
a evidência de que uma obra de engenharia goza de identidade própria, a mesma Lei
nº 5.194/1966 traz o instituto da coautoria do projeto (art. 19), e, ao mesmo
tempo, prevê regra à autoria de parte desse projeto (art. 20).

Quanto
à possibilidade de o profissional ser autor de apenas uma parte do projeto, tal
ocorre em virtude da restrição de mercado ofertada àqueles que são legalmente
habilitados ao exercício de certa atividade. Exemplo. Não pode um engenheiro
civil responder pelo projeto das instalações mecânicas de um shopping center
(elevadores, climatização, escadas rolantes etc.), tampouco responder pelas
instalações elétricas de média e alta tensão do empreendimento ilustrado
(subestações, redes de distribuição).

Entretanto,
para que possa ser legalmente edificada, a construção exemplificada necessitará
da participação do engenheiro mecânico e do engenheiro eletricista (entre
outros especialistas). Serão esses os profissionais incumbidos da elaboração
dos projetos das instalações e/ou demais partes da construção para as quais
profissionais outros não detêm habilitação legal. Serão, pois, autores de parte
da criação (solução).

Por
sua vez, a coautoria é caracterizada pelo conjunto de profissionais
responsáveis pela criação da concepção geral. Por óbvio, pois é o todo que
conduz à unicidade de um projeto, sendo a identidade da obra reforçada ao ponto
de ser codificada. Não podem obras distintas usufruírem de mesma identificação.
No limite, a obra de engenharia será batizada com um nome próprio.

Assim,
de pronto que a inferência em destaque é causadora de certa perturbação às
definições encartadas nas normas que atualmente regulam às contratações de
obras públicas. É que, gozando uma obra de engenharia de identidade própria, será
forçoso admitir-se que as reformas e as recuperações não preenchem tal
requisito (confira-se à Lei nº 8.666/93, art. 6º, inc. I).

No
caso das reformas, mesmo que tais intervenções modifiquem por completo as
características iniciais da obra, ofereçam outras destinações de uso e/ou até
mesmo alterem seu nome, ainda assim, o todo permanecerá intacto. A diferença é
que antes a obra servia como solução para certa(s) necessidade(s), agora,
atenderá necessidade(s) outra(s). Contudo, o embrião de sua identidade restará
inabalável.

A
bem da verdade, de forma muito mais acertada a legislação imperial brasileira
já discriminava os conceitos de obra e reforma(confira-se
à Coleção de Leis do Império do Brasil. Dec. nº 2.926/1862, art. 1º). Não que na
prática das atuais licitações da Administração Pública tal distinção implique
em consequências de maior relevo (exceção aos limites de acréscimos às
alterações contratuais). De modo análogo, a diferenciação dos conceitos de obras
e reformas em nada diminui às habilidades e competências necessárias aos
projetos de reformas (não raras vezes, mais complexos e desafiadores que a obra
original).

Então,
poder-se-ia questionar o motivo para restabelecer tal diferenciação.

A
resposta é simples, mas de importância imensa. É que a responsabilidade pela
intervenção em trabalho intelectual de quem lhe antecedeu deve ser tomada como
uma honra. Trata-se, tão somente, de dignificar adequadamente o trabalho e o
esforço daqueles que contribuíram com a evolução dessa área do conhecimento
humano.

É
essa a razão precípua pela qual entendo necessária uma compreensão mais
profunda dos conceitos de autoria, projeto e obra de engenharia.

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